ANEEL quer avaliar possível comercialização de energia no modelo de geração distribuída

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A Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) abriu uma Tomada de Subsídio (TS 018/2023) para avaliar a necessidade de novas regras para coibir eventual comercialização de energia na modalidade de geração remota, que inclui o autoconsumo remoto e geração compartilhada.  

A Tomada de Subsídio, cujo período de contribuição é de 3 de novembro de 2023 a 31 de janeiro 2024, é uma fase inicial de discussões onde a ANEEL procura colher subsídios da sociedade para avaliar uma eventual necessidade de intervenção regulatória.  

Caso o tema avance, a Agência estabelece uma nova discussão com a abertura de uma Consulta Pública, antes da aprovação final do novo regulamento.  

Contexto legal 

A geração distribuída foi regulamentada em 17 de abril de 2012 (Resolução Normativa ANEEL nº 482/12). Na ocasião foi criado o Sistema de Compensação de Energia Elétrica (SCEE). Na prática, foi estabelecido que as unidades consumidoras com micro e minigeração distribuída (MMGD) não poderiam comercializar a energia, apensar acumular créditos de energia e utilizá-los para compensar eventual consumo de energia da concessionária de distribuição.  

Em 24 de novembro de 2015, a ANEEL editou a REN nº 687, que alterou os limites de potência das usinas de mini e microgeração, assim como criou novas modalidades de geração distribuída: empreendimentos de múltiplas unidades consumidoras e a geração compartilhada.  

A GD compartilhada consiste em permitir que uma única usina, normalmente de porte maior, distribua os créditos de energia para duas ou mais unidades consumidoras. Essa é uma das modalidades que mais devem crescer nos próximos anos no Brasil, sobretudo por meio da fonte solar fotovoltaica. É a partir desse negócio que foi viabilizado o modelo que ficou conhecido como energia solar por assinatura.  

Em 7 de janeiro de 2022 foi publicada a Lei 14.300, conhecida como marco legal da geração distribuída.  No artigo nº 28, fica expresso que a GD é caracterizada como produção de energia para consumo próprio.  

Em 7 de fevereiro de 2023, a ANEEL aprovou a regulamentação da Lei 14.300 através da Resolução Normativa nº 1.059. Nesta mesma data, ANEEL determinou que a Superintendência de Regulação dos Serviços de Transmissão e Distribuição de Energia Elétrica (STD) avaliasse a necessidade de instituir eventuais comando regulatórios específicos para promover a aplicação do disposto no art. 28 da Lei 14.300/22.  

Pela redação da REN 1.059/23, ficou expresso nos seguintes dispositivos:  

Art. 655-D […]

§ 3º É vedada a inclusão de consumidores no SCEE nos casos em que for detectado, no documento que comprova a posse ou propriedade do imóvel onde se encontra instalada ou será instalada a microgeração ou minigeração distribuída, que o consumidor tenha alugado ou arrendado terrenos, lotes e propriedades em condições nas quais o valor do aluguel ou do arrendamento se dê em reais por unidade de energia elétrica.

§ 5º É vedado o enquadramento no SCEE de unidade consumidora com microgeração ou minigeração distribuída que não se caracterize como produção de energia elétrica para consumo próprio.

Art. 655-M […]

§ 5º É vedada a comercialização de créditos e excedentes de energia, assim como a obtenção de qualquer benefício na alocação dos créditos e excedentes de energia para outros titulares, aplicando-se as disposições do art. 655-F caso isso seja constatado.

Ou seja, está claro que independente do arranjo de geração distribuída, é vedada a comercialização, ainda que implícita, dos créditos e excedentes de energia, exceto nos casos previstos nos artigos 24 e 36-A da Lei nº 14.300/2022: 

a) comercialização de excedente de energia com a distribuidora local (art. 24)

A concessionária ou permissionária de distribuição de energia elétrica deverá promover chamadas públicas para credenciamento de interessados em comercializar os excedentes de geração de energia oriundos de projetos de microgeradores e minigeradores distribuídos, nas suas áreas de concessão, para posterior compra desses excedentes de energia, na forma de regulamentação da ANEEL. 

b) comercialização de excedente de energia elétrica com órgãos públicos (art. 36-A, inserido pela Lei nº 14.620/2023)

A unidade consumidora participante do SCEE poderá comercializar excedente de energia elétrica com órgãos públicos desde que seja beneficiária de programa social ou habitacional das esferas federal, estadual, distrital ou municipal.  

Indícios de descumprimento das regras 

Portanto, apenas os consumidores livres e especiais têm liberdade para comprar energia de qualquer fornecedor. Os consumidores do mercado cativo obrigatoriamente devem comprar energia da distribuidora local. Dessa forma, qualquer arranjo comercial da geração distribuída precisa respeitar esses comandos legais, respeitando a vedação de qualquer forma de comercialização de energia. 

Entretanto, segundo a ANEEL, “há indícios de que alguns modelos de negócio de geração remota anunciados no mercado de micro e minigeração distribuída se valem dessas modalidades de participação no SCEE para, na prática, comercializarem energia, ofertando excedentes de energia a preços mais módicos do que as tarifas reguladas praticadas pelas distribuidoras às custas de subsídios tarifários custeados por todos os usuários do sistema de distribuição de energia elétrica” (Trecho retirado da Nota Técnica nº 101/2023).  

“Nesses modelos de negócio, um terceiro instala, mantém e opera o ativo de geração distribuída ao qual o consumidor interessado vincula-se, recebendo excedentes de energia gerados por este ativo, e se compromete em troca a realizar pagamentos a este terceiro. Há casos em que a participação nesses modelos ocorre sem necessidade de qualquer aporte de investimento pelo interessado e com a possibilidade de encerramento da participação a qualquer prazo e sem restrições”, diz a ANEEL.  

Em 05 de outubro de 2013, a geração distribuída atingiu 24 gigawatts (GW) de capacidade instalada no Brasil, sendo 660 megawatts (MW) na modalidade geração compartilhada e 5,37 GW no autoconsumo remoto. Ou seja, a geração remota corresponde a 25,11% da GD no país.  

Nesse contexto, vale destacar o impacto que uma eventual captura indevida de subsídios tarifários pode gerar no setor. De acordo com a ANEEL, a micro e minigeração distribuída encareceram as tarifas dos demais consumidores de todo o Brasil em mais de R$ 2,8 bilhões em 2022.  

Questões para subsidiar a discussão 

Com a intenção de propiciar um direcionamento para as discussões da Tomada de Subsídio nº 18/2023, a ANEEL elaborou um conjunto de questões a serem respondidas pelos agentes: 

  1. Quais situações existentes no mercado podem ser enquadradas como comercialização de energia no SCEE?
  2. Quais elementos poderiam caracterizar ou dar indícios de uma comercialização de energia no SCEE?
  3. Quais seriam as condições necessárias para a distribuidora comprovar a posse/propriedade da central de micro ou minigeração distribuída pelos beneficiados pela geração remota?
  4. Deve-se exigir no momento da solicitação a apresentação do contrato firmado com a associação para participar da geração compartilhada?
  5. Seria viável adotar um modelo de contrato com cláusulas mínimas para participação em associação de geração compartilhada?
  6. A forma de cobrança pela participação na geração compartilhada pode corresponder a um rateio dos custos referentes a central de micro ou minigeração distribuída?
  7. A forma de cobrança pela participação na geração compartilhada pode apresentar relação com as tarifas reguladas das distribuidoras?
  8. Deveria ser aplicado um tratamento regulatório similar ao do tema da troca de titularidade para caracterizar a posse ou propriedade da central de micro, ou minigeração distribuída, de forma a mitigar a comercialização de energia no SCEE?
  9. Deveria ser aplicado um tratamento regulatório similar ao do tema da vedação de divisão para mitigar a comercialização de energia no SCEE?

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