As mudanças climáticas estão desafiando diversos setores da economia global, incluindo os mercados de energia.
No Brasil, já estamos acostumados a conviver com tarifas elevadas sempre que chove pouco – afinal, a nossa matriz elétrica é majoritariamente (55%) composta por hidrelétricas e, portanto, dependemos das afluências para garantir energia barata para a população.
Acontece que as chuvas – tão importantes para oferta de energia – estão desafiando a capacidade de operação das redes de transmissão e distribuição de energia. A pergunta que fica é: estamos preparados para conviver com a falta de energia sempre que há uma tempestade?
Neste resumo regulatório, nossa intenção é jogar luz sobre uma recente discussão aberta pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), com a intenção de analisar a necessidade de intervenção regulatória para aumentar a resiliência dos sistemas de transmissão e distribuição de energia diante de eventos climáticos extremos.
A seguir vamos abortar:
- contexto: tempestades deixam milhões de pessoas em energia;
- abertura da Tomada de Subsídios 02/2024;
- próximos passos.
Contexto: tempestades deixam milhões de pessoas em energia
No dia 3 de novembro de 2023, uma forte tempestade acompanhada por ventos de 100 km/h deixou 2,5 milhões de consumidores sem energia elétrica em todo o Estado de São Paulo, sendo 2,1 milhões somente da área de concessão de uma única distribuidora.
A chuva derrubou centenas de árvores sobre a rede elétrica e arrancou postes, causando o rompimento de quilômetros de fios. Após 6 dias, milhares de consumidores ainda estavam sem luz em suas casas e comércios.
A Associação Comercial de São Paulo (ACSP) estimou que o comércio paulista deixou de arrecadar R$ 126 milhões devido à fala de energia nesse período.
A ANEEL entendeu que uma grande empresa que atende a capital de São Paulo descumpriu a exigência regulatória de manter a rede operando de forma adequada e aplicou uma multa de R$ 165 milhões. O Procon-SP também multou a companhia em R$ 12,8 milhões pela demora no reestabelecimento da energia.
O caso ganhou tamanha repercussão nacional que a Câmara de Vereadores de São Paulo abriu uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI). Os deputados chegaram a convocar o presidente da distribuidora para dar explicações sobre o ocorrido.
Para colocar mais lenha na fogueira, no dia 18 de novembro, uma distribuidora do Rio de Janeiro também teve a sua área de concessão atingida por evento climático que provocou a interrupção do fornecimento de energia de aproximadamente 1,2 milhão de consumidores. Estados da região Sul, como Santa Catarina e Rio Grande do Sul, também passaram por situações semelhantes.
Pressionada a dar uma resposta, a ANEEL convocou uma reunião no dia 29 de novembro com a Associação Brasileira dos Distribuidores de Energia (ABRADEE) e várias distribuidoras com o objetivo de discutir ações para serem implementadas no curto, médio e longo prazo, para mitigar os efeitos dos eventos climáticas na prestação do serviço de energia.
Abertura da Tomada de Subsídios 02/2024
Agora que você já sabe o contexto, vamos ao que interessa. No dia 9 de fevereiro de 2024, a ANEEL lançou a Tomada de Subsídios (TS) 02/2024. A intenção é discutir com os agentes do setor elétrico a eventual necessidade de intervenção regulatória para exigir das distribuidoras e das transmissoras investimentos para aumentar a resiliência das redes frente a eventos climáticos extremos. O prazo de contribuição vai até 25 de março de 2024.
“Eventos climáticos extremos, como vendavais, tempestades severas, enchentes e incêndios florestais representam desafios significativos para as concessionárias de energia elétrica. Tais eventos podem resultar em interrupções no fornecimento de energia, afetando comunidades inteiras e setores essenciais da economia”, destacou a ANEEL na Nota Técnica nº 7/2024.
A regulação do setor elétrico já define uma série de parâmetros e incentivos para que as transmissoras e distribuidoras promovam a recomposição da rede no menor tempo possível. Por exemplo, as distribuidoras devem compensar os consumidores sempre que o período de falta de energia ultrapassar o limite estabelecido pela regulação.
No entanto, com a maior frequência de eventos climáticos extremos, a sociedade espera que as regras evoluam de acordo com as necessidades atuais e disponibilidade de novas tecnologias para uma atuação preventiva dos prestadores de serviço.
A ANEEL entende que a manutenção da integridade da rede elétrica desempenha um papel crucial na segurança econômica e social do país. Portanto, investir em tecnologias que fortaleçam a capacidade de enfrentar eventos climáticos é fundamental.
As distribuidoras já dispõem de Planos de Contingência para enfrentar momentos de crise. Neles constam ações como:
- mapeamento das áreas com maior de incidência de ocorrências – identificação dos principais ofensores;
- monitoramento das condições meteorológicas;
- ações e medidas preventivas adotadas – supressão e manejo de vegetação, inspeções em equipamentos, estoque de materiais;
- adoção de ações e medidas emergenciais de acordo com o nível de criticidade – mobilização adicional de equipes e acionamento de outras áreas da empresa, incremento do atendimento ao consumidor (call center, canais digitais, …), garantia de fornecimento para consumidores sensíveis (serviços essenciais e usuários de equipamentos vitais);
- comunicação externa – canais de comunicação com a população e poder público, envio de avisos; e
- articulação com os órgãos públicos e autoridades locais – participação em Salas de Cooperação.
A ANEEL avaliará a necessidade de estabelecer novos parâmetros normativos para aumentar a eficiência e eficácia dos planos de continência.
Por fim, um tópico a ser discutido é o compartilhamento de equipes de atendimento e equipamentos entre concessionárias. O compartilhamento é visto como importante, porém há uma preocupação com o impacto na qualidade do serviço da concessão, visto que tais recursos farão falta na prestação do serviço.
Próximos passos
A Tomada de Subsídios é só o primeiro passo de uma longa discussão em torno desse tema. Após o prazo de contribuição, a ANEEL avaliará todas as sugestões, acolhendo-as que entender pertinentes.
Depois disso, uma nova Nota Técnica será produzida com as propostas de aprimoramentos regulatórios. Nesta etapa, uma Consulta Pública deve ser aberta para discutir as propostas, para só depois concluir o processo já com as ações que serão implementadas para aumentar a resiliência das redes elétricas.
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Como vimos, esse é um tema delicado que deve suscitar debates acalorados nos próximos meses. Porém, não há dúvidas da relevância de promover ações para minimizar os impactos das mudanças climáticas no setor elétrico.
Vamos acompanhar esse assunto de perto e trazer os desdobramentos desse processo sempre que houver alguma novidade.
Esperamos que esse conteúdo tenha sido útil. Uma das missões da Simple Energy é compartilhar conhecimento, oferecendo informação de qualidade e confiável.
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